sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Megazord



É tão difícil achar alguém que combine com a gente. Em casa, por mais que todos digam quão parecidos são, pais e filhos podem ter uma única diferença capaz de colocar fogo no mundo. Com os amigos, você tem afinidades e acaba criando hábitos, gestos e gostos comuns ao grupo. Acontece sempre! Ainda assim, chega uma hora que há um ponto conflitante que faz parecer impossível uma amizade ter durado tantos anos. E no amor? Alguns dizem que procuramos alguém parecido com nossos pais, outros que tem que ser uma pessoa que, quando a paixão findar, fique a amizade. Claro que vai ter momentos de guerra.

A verdade é que ninguém é igual, mas todos passam a vida procurando pessoas que sejam. Que sejam para nos mostrar nossos próprios defeitos, entender aquelas paranoias ou apenas conseguir trocar um olhar e fazer-se entendido. Se é DNA, natureza do homem ou seja lá o que for, queremos que alguém entenda o nosso desaparecimento repentino, nossa euforia por coisa boba, uma ironia tuitada, uma música brega, um programa de índio, uma briga ridícula ou a preferência que há de um amigo em detrimento ao outro.

Agora é o ponto que me contradigo. Não existem pessoas assim, iguais. Só que, às vezes, a gente encontra. E nem tudo é lindo, só que até as brigas que acontecem são do jeito que você pensou. É como dançar com uma desconhecida a coreografia que você criou e saber que ela é mestra naquilo. Até os descrentes começam a aceitar que o amor existe. Se amor não é isso, deveriam inventar um nome praquele que deve ser o sentimento mais prazeroso do mundo. Perdoo-me as próprias pieguices! E até o fato de citá-las, já que mea culpa também soa como tal.

E como podem ser dois tão sincronizados?! Não se completam, não se entendem. São “é”, no singular. Não são almas gêmeas, não são extensão um doutro, nada. São tão parecidos que as semelhanças de pais e filhos e entre amigos não parecem pequenas, mas soam menos natural.

Quando encontrei essa pessoa, claro que estou falando de mim, parecíamos vir de mundos diferentes. Destoávamos até nas cores para soar ainda mais mexicano. Todos incompreendem como chegamos até o ponto que chegou. Juntos, éramos quase um megazord, potencializadas todas aquelas características que tínhamos. Existia ali a comédia, o humor ácido, a cumplicidade, a troca de olhares, a ironia, a agressão, o bem, o mal, as histórias vividas estampadas no rosto, os desejos que eram diferentes apenas superficialmente.

Do nada, quando em seu ápice, um corte frio. Estranhamento que com o tempo do afastamento, que com a dor ora cicatrizada ora latente, voltara a parecer nascidos nós em planetas vizinhos. Era triste, mas era reconfortante. Tal qual um respiro livre de alguém que passara os últimos anos preso em uma redoma com ar controlado. Havia até, em certo momento, felicidade. Felicidade de quem quis e conseguiu seguir em frente, dar um passo, amadurecer, largar-se de um vício. Dependência, em sua melhor definição. Superação, em meu maior clichê.

Era felicidade de gente que não é feliz. Olhem bem, era feliz por coisas que servem apenas para provar aos outros que somos alguém e fizemos algo. Tentei justificar que estava correto, e como tentei. Acreditei que só seria feliz assim já que, infelizmente, ligo tanto para os demais, para o que pensam; e que fico pressionado pela minha própria natureza a pensar, repensar e agir de uma forma que pareça ok, que corresponda aos planos que são feitos minuto a minuto. Tá, talvez isso realmente faça que eu seja feliz. Só que há algo que faz bem mais.

Não é amor, carinho. É toda aquela raiva, aquela cumplicidade, aquele ódio. O megazord! É ser leal, é ser ilegal, é ser real. E decidido, não fazia mais sentido passar a vida lutando para ser feliz à custa de privar aquilo que, pura e simplesmente, traz felicidade instantânea. Sem sentido, optei por ir contra todos, optei por ser mais lógico.

E me arrependi, e fui feliz, tive os melhores e os piores momentos da minha vida. Se fosse um pouco mais popular, diria que antes se arrepender do que fez do que pelo que não foi feito, mas não. Só entendi que é melhor ser alegre do que ser triste. Ah, se os piores momentos eram causados por aquela que era a minha maior alegria, valeu vivê-los.

Quem eu fui a vida inteira deveu-se àquela hora que decidi recuar e ligar menos para os amigos, de ser mais chato e acusado de burro, quando me inspirei em quem tanto critiquei. Os conselhos que dou aos meus filhos, o emprego que escolhi e as discussões que decidi perder, tudo tem um início lá atrás. Não foi lá que eu me tornei quem eu sou, mas sim quando eu aprendi a lidar com isso.

Ainda tem muita coisa pra viver. E agora eu sigo, sem me punir por saber que talvez eu volte. Afinal, se o caminho natural é esse, se todo o bem feito me trouxe até aqui é porque aqui era pra eu estar. Não, não é destino. Destino é coisa de preguiçoso. Não é amor, sou objetivo demais pra isso. Não que faça sentido ou tenha escolhido uma frase um pouco mais profunda para terminar o texto de forma pedante, não. Só é o que é: eu, ela e o que é que isso signifique quando for para significar.

Leia também: A Mulher Perfeita.
O último texto publicado foi: Difícil fazer um poema.

Um comentário:

  1. Muito bom. Vale a pena ler até o fim. Engraçado que dá uma sensação mista de "que bom que vc escolheu ser feliz" com "putz...coitado, se fudeu..." com "é...a vida é assim...teste atrás de teste pra saber quem somos..."
    =p
    bom msmo.

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